É importante que
o professor mostre as diferenças e semelhanças
exintentes
na
crônica
e no conto através dos
parágrafos,
frisando atentamente as particularidades
de
cada
gênero.
Lembramo-lo que
houve
várias
etapas
anteriores,
baseadas
nas
sequências
didáticas,
para
chegarmos
nesta
aqui
mencionada.
Bom trabalho!!!
CRÔNICA: por vezes é confundida com
o conto. A diferença básica entre os dois é que a crônica narra fatos do dia a
dia, relata o cotidiano das pessoas, situações que presenciamos e já até
prevemos o desenrolar dos fatos. A crônica também se utiliza da ironia e, às
vezes, até do sarcasmo. Não necessariamente precisa se passar em um intervalo
de tempo.
CONTO: é uma narrativa curta. O
tempo em que se passa é reduzido e contém poucas personagens que existem em
função de um núcleo. É o relato de uma situação que pode acontecer na vida das
personagens, porém não é comum que ocorra com todo mundo. Pode ter um caráter
real ou fantástico, da mesma forma que o tempo pode ser cronológico ou
psicológico.
A CRÔNICA é um gênero híbrido que
oscila entre a literatura e o jornalismo, resultado da visão pessoal,
particular, subjetiva do cronista ante um fato qualquer, colhido no noticiário
do jornal ou no cotidiano. É uma produção curta, apressada (geralmente o
cronista escreve para o jornal alguns dias da semana, ou tem uma coluna
diária), redigida numa linguagem descompromissada, coloquial, muito próxima do
leitor. Quase sempre explora o humor; mas, às vezes, diz coisas sérias por meio
de uma aparente conversa fiada. Noutras, despretensiosamente faz poesia da
coisa mais banal e insignificante.
É o relato de um flash, de um breve
momento do cotidiano de uma ou mais personagens. O que diferencia a crônica do
conto é o tempo, a apresentação da personagem e o desfecho.
O CONTO é uma história completa e
fechada como um ovo. É uma célula dramática, um só conflito, uma só ação. A
narrativa passiva de ampliar-se não é conto.
CRÔNICA
E CONTO
No Aeroporto
Viajou meu amigo
Pedro. Fui levá‐lo ao Galeão, onde esperamos três horas o
seu quadrimotor. Durante esse tempo, não faltou assunto para nos entretermos,
embora não falássemos da vã e numerosa matéria atual. Sempre tivemos muito
assunto, e não deixamos de explorá‐lo a fundo.
Embora Pedro seja
extremamente parco de palavras, e, a bem dizer, não se digne de pronunciar
nenhuma. Quando muito, emite sílabas; o mais é conversa de gestos e expressões
pelos quais se faz entender admiravelmente. É o seu sistema.
Passou dois meses
e meio em nossa casa, e foi hóspede ameno. Sorria para os moradores, com ou sem
motivo plausível.
Era a sua arma,
não direi secreta, porque ostensiva. A vista da pessoa humana lhe dá prazer.
Seu sorriso foi logo considerado sorriso especial, revelador de suas boas
intenções para com o mundo ocidental e oriental, e em particular o nosso trecho
de rua. Fornecedores, vizinhos e desconhecidos, gratificados com esse sorriso
(encantador, apesar da falta de dentes), abonam a classificação.
Devo dizer que Pedro, como visitante, nos deu trabalho; tinha
horários especiais, comidas especiais, roupas especiais, sabonetes especiais,
criados especiais. Mas sua simples presença e seu sorriso compensariam
providências e privilégios maiores.
Recebia tudo com
naturalidade, sabendo‐se merecedor das distinções, e ninguém se lembraria de
achá‐lo egoísta ou importuno.
Suas horas de
sono ‐ e lhe apraz dormir não só à noite como principalmente de dia ‐ eram
respeitadas como ritos sagrados, a ponto de não ousarmos erguer a voz para não
acordá‐ lo. Acordaria sorrindo, como de costume, e não se zangaria com a gente,
porém nós mesmos é que não nos perdoaríamos o corte de seus sonhos. Assim, por
conta de Pedro, deixamos de ouvir muito concerto para violino e orquestra, de
Bach, mas também nossos olhos e ouvidos se forraram à tortura da tevê. Andando
na ponta dos pés, ou descalços, levamos tropeções no escuro, mas sendo por amor
de Pedro não tinha importância.
Objetos que visse
em nossa mão, requisitava‐os. Gosta de óculos alheio (e não os usa), relógios
de pulso, copos, xícaras e vidros em geral, artigos de escritório, botões
simples ou de punho.
Não é
colecionador; gosta das coisas para pegá‐las, mirálas e (é seu costume ou sua
mania, que se há de fazer) pôr‐las na boca. Quem não o conhecer dirá que é
péssimo costume, porém duvido que mantenha este juízo diante de Pedro, de seu
sorriso sem malícia e de suas pupilas azuis ‐ porque me esquecia de dizer que
tem olhos azuis, cor que afasta qualquer suspeita
ou acusação apressada, sobre
a razão íntima de seus atos.
Poderia acusá‐lo
de incontinência, porque não sabia distinguir entre os cômodos, e o que lhe
ocorria fazer, fazia em qualquer parte? Zangar‐me com ele porque destruiu a
lâmpada do escritório? Não. Jamais me voltei para Pedro que ele não me
sorrisse; tivesse eu um impulso de irritação, e me sentiria desarmado com a sua
azul maneira de olhar‐me. Eu sabia que essas coisas eram indiferentes à nossa
amizade – e, até, que a nossa amizade lhe conferia caráter necessário de prova;
ou gratuito, de poesia e jogo.
Viajou meu amigo
Pedro. Ficou refletindo na falta que faz um amigo de um ano de idade a seu
companheiro já vivido e puído. De repente o aeroporto ficou vazio.
Carlos Drummond de Andrade
Uma galinha
Parecia calma. desde sábado encolhera-se num cante da
cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a
escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era
gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um anseio.
Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de
curto vôo, inchar o peito e, em dois ou três lances, alcançar a murada do
terraço. Um instante ainda vacilou – o tempo da cozinheira dar um grito – e em
breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro vôo desajeitado, alcançou
o telhado. Lá ficou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora noutro pé. A
família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma
chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer
esporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho
e resolveu seguir o itinerário da galinha: em pulos cautelosos alcançou o
telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo. A
perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de
um quarteirão de rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a
galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio
de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais intima que
fosse a presa o grito de conquista havia soado.
Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava,
muda, concentrada. Às vezes, na fuga, pairava ofegante num beiral de telhado e
enquanto o rapaz galgava outros com dificuldade tinha tempo de se refazer por
um momento. E então parecia tão livre.
Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um
galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que fazia dela um ser? A
galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem
ela própria contava consigo, como. o galo crê na sua crista. Sua única vantagem
é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra tão
igual como se fora a mesma.
Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua
fuga, o rapaz alcançou. Entre gritos e penas, ela foi presa. em seguida
carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da
cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu- se um pouco, em cacarejos
roucos e indecisos.
Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha
pôs um ovo. Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois,
nascida que fora para a maternidade, parecia uma velha mãe habituada. Sentou-se
sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos. Seu
coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de
tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e
assistiu tudo estarrecida. Mal porém
conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão e saiu aos
gritos:
– Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! ela quer o nosso
bem!
Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a
jovem parturiente. Esquentando seu filho, esta não era nem suave nem arisca,
nem alegre nem triste, não era nada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum
sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há algum tempo, sem
propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma cabeça de
galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:
–
Se você mandar matar esta
galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!
–
Eu também! jurou a menina
com ardor.
A mãe, cansada, deu de ombros.
Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha
passou a morar com a família. A menina, de volta do colégio, jogava a pasta
longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se
lembrava: "E dizer que a obriguei a correr naquele estado!" A galinha
tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha
e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a da apatia e a do
sobressalto
Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam
tê-la esquecido, enchia-se de uma pequena coragem, resquícios da grande fuga e
circulava pelo ladrilho, o corpo avançando atrás da cabeça, pausado como num
campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se rápida e vibrátil, com o
velho susto de sua espécie já mecanizado.
Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de
novo a galinha que se recortara contra o ar à beira do telhado, prestes a
anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se
fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente.
Embora nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga,
no descanso, quando deu à luz ou bicando milho – era uma cabeça de galinha, a
mesma que fora desenhada no começo dos séculos.
Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se
anos.
Clarice Lispector, Laços de família.
Qual a Semelhança entre conto e crônica??
ResponderExcluirO que diferencia a crônica do conto é o tempo, a apresentação da personagem e o desfecho.
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